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A nova década do lobby

O que vem por aí no mundo das Relações Institucionais e Governamentais (RIG)? Como analisar a década que passou e entender a que começou agora? Confira o artigo de Eduardo Galvão, diretor de Relações Governamentais da consultoria BCW, professor dos MBAs de Relações Institucionais e de Políticas Públicas do Ibmec e fundador do Pensar RelGov, para a seção Insights da Sigalei.

Publicado em:
4/1/2021
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década de 10 iniciou com um ambiente de desconfiança para o lobby. Nos anos 2000, ainda sem muita informação pública a respeito, o lobby ganhou a pecha de atividade ilícita. Os termos lobby e lobista eram frequentemente utilizados como sinônimos de corrupção e de operador de propina (até o início da década, esse termo ainda não tinha ganhado espaço). 

Fazer lobby era sinônimo de ato escuso, obscuro, de troca de favores não republicanos. A Lei do Lobby nos EUA havia, há pouco, sido reformada (em 2007), motivada por casos de corrupção. No Brasil, as poucas publicações acadêmicas sobre o assunto já prenunciavam uma mudança na agenda de pesquisa científica. No Legislativo, o PL 1202/2007, que propõe regulamentar o lobby, havia sido apresentado e chegou a ser aprovado na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados, mas não foi analisado pela Comissão de Constituição e Justiça. Assim iniciava a década de 10.

Mas o que se seguiu a partir daí foi uma verdadeira transformação do lobby no Brasil. Se os anos 2000 foram marcados pela falta de informação e pela pecha de ilicitude, a década de 10 foi a época de reposicionamento do lobby no debate público. 

Um dos grandes fatores de mudança foi a criação de diferentes cursos de capacitação em Relações Institucionais e em Relações Governamentais, em formatos de especialização e de MBA, e ainda a inclusão de matérias específicas em cursos de graduação em Ciência Política, Gestão de Políticas Públicas e em Marketing em universidades públicas e privadas. Alunos que logo estarão trabalhando em órgãos públicos e que leram, aprenderam e conviveram com professores lobistas. Essa consolidação do ambiente acadêmico do lobby abriu frentes de pesquisa científica e de publicações técnicas. Diversos livros especializados foram publicados e entraram nos programas bibliográficos dos cursos, que por sua vez, desencadearam a publicação de muitos artigos acadêmicos, multiplicando a matriz de conhecimento sobre lobby.

Reflexo da consolidação do ambiente acadêmico, foi a especialização que a área teve. A troca de conhecimento entre professores experientes e jovens profissionais elevou o nível de capacitação, trazendo uma roupagem muito mais técnica e especializada dos atuantes, que adensaram conhecimento em técnicas, ferramentas e habilidades específicas de Relações Governamentais. Outro reflexo dessa consolidação acadêmica foi os lobistas terem sido não apenas pesquisadores do tema, mas também serem objeto de pesquisa até mesmo de outras áreas de atuação, como Comunicação, Marketing e Direito. A agenda de pesquisa sobre lobby aumentou e trouxe novos olhares sobre a atividade.

Com maior troca de informações, aumentaram os fóruns e as redes de cooperação entre profissionais, seja em entidades representativas, think tanks, grupos de pesquisa, comunidades, projetos sociais e redes de relacionamento, adensando a interlocução entre lobistas. Nesse mesmo ambiente houve o intenso aumento das redes sociais por pessoas em todo o mundo e esse foi um grande fator transformador, uma vez que permitiu a criação de mais redes de relacionamento, fóruns de participação e cooperação mútua e a multiplicação das interações. As redes de colaboração ainda trouxeram mais visibilidade à atividade, premiações e até um anuário de profissionais.

A intensificação das redes de colaboração e a consolidação do uso de redes sociais por aplicativos criaram um ambiente mais participativo para discussão sobre a regulamentação do lobby, que foi outra grande característica dessa década. 

O PL 1202/2007, que estava na CCJ, foi objeto de audiência pública na comissão, com a participação de representantes de diferentes segmentos, recebeu contribuições e teve um substitutivo apresentado a partir dessas colaborações. O tema também foi debatido em audiência pública da CGU e recebeu contribuições sobre o que seria a regulamentação no Poder Executivo. Mais tarde, o Ministério do Trabalho reconheceu a atividade na Classificação Brasileira de Ocupações, formalizando o trabalho do lobista. Em seguida, a ABNT editou uma norma de boas práticas como recomendação à atuação profissional. E a nova regulamentação do Executivo foca na relação: reforçando a transparência e dando amplo conhecimento das agendas, agentes e temas em discussão.

Os movimentos sociais ocorridos em 2013 transformaram o cidadão. A confusão de diferentes indignações que motivaram as passeatas, culminaram por convergir numa grande questão: o brasileiro estava cansado da corrupção. E esse (novo) brasileiro era diferente: mais politizado, mais participativo, mais conectado e com um celular na mão! O interesse do brasileiro por política aumentou. E o trabalho das organizações e instituições seguiu o fluxo.

Mas como a Internet era uma terra sem lei intensamente frequentada, em que militantes e robôs travavam infinitas guerras de narrativas, as fake news encontraram ambiente propício para disseminação. Esse outro fator intensificou muito o trabalho dos lobistas. Isso porque esses profissionais são a interlocução entre Governo e sociedade. E deu um trabalho enorme ficar separando o que era fato do que era fake, pros dois lados.

A digitalização, ou a intensificação do uso de ferramentas digitais, foi outra grande marca da época. Com um ambiente de produção legislativa maior e mais rápido, multiplicidade de agentes, de discursos, de notícias, de discussões, o ambiente ficou impossível de ser monitorado pelo olho humano. Literalmente. E nesse contexto as ferramentas digitais encontraram seu espaço, que atendia às necessidades do novo lobista. As empresas de tecnologia da informação passaram a ser as grandes parceiras dos lobistas, que ganharam um novo colega de equipe: o robô.

E por último, coroando o fechamento da década de 10, veio a pandemia. O vírus Covid-19 levou embora muita gente, causou muita dor e transformou nossa sociedade de maneira profunda e para sempre. Também no lobby, fomos empurrados à mudança, forçados a nos adaptar. O ambiente de participação social ficou mais restrito, com os fóruns tradicionais inviabilizados pelo isolamento social. E com isso Governo, sociedade e lobistas mergulhamos no ambiente digital, multiplicamos nossas horas de trabalho e tivemos que reinventar coisas básicas, como dialogar.

Talvez pela conjunção de todos esses fatores, o lobby foi ressignificado. Ainda não foi possível apartar o termo lobby do termo corrupção. Mas hoje avançamos muito no conhecimento sobre o que é a atividade e o entendimento do que é lobby vai se distanciando cada vez mais do termo corrupção e se aproximando dos termos democracia e políticas públicas. Com isso encerramos a década de 10 do lobby. Com o início de uma transformação, uma mudança de rumos, com bases sólidas fundadas e boas sementes plantadas.

Como será a década de 20, ainda vamos saber. Mas estamos melhores do que antes. Se na década que se findou, nossa história começava com desconfiança e desinformação, nossa nova década começa com conhecimento, colaboração, digitalização e transparência. Um presságio de otimismo para os novos tempos.

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Nota do editor: A equipe de RIG da sua organização está preparada para a nova década do lobby? Conte com os especialistas da Sigalei para isso. Entre em contato e saiba mais!


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