<< Voltar para o Blog da Sigalei

Regulamentação do direito à informação quanto ao uso de animais vivos na obtenção de produtos e substâncias

Artigo produzido pelos alunos de graduação do curso de relações internacionais da ESPM. Grupo vencedor do prêmio ESPM-Sigalei

Publicado em:
24/7/2023

**Artigo produzido pelos alunos de graduação do curso de relações internacionais da ESPM. Grupo vencedor do prêmio ESPM-Sigalei**

O projeto de lei, do ex-Deputado Ricardo Izar, tem como objetivo a regulamentação do direito à informação quanto ao uso de animais vivos na obtenção de produtos e substâncias. Ela exige que os fabricantes informem nos rótulos de seus produtos se houve a realização de testes em animais vivos no desenvolvimento do mesmo. Os rótulos e recipientes devem constar, em destaque,  a expressão “obtido a partir de testes com animais vivos,” em conjunto com um símbolo definido em ato do Ministério da Justiça. Além disso, com a finalidade de que tal informação acompanhe o produto em toda a cadeia produtiva, a expressão também deverá ser mencionada no documento fiscal. O projeto espera ainda que o consumidor tenha ciência sobre a espécie de animal utilizada para a obtenção do produto, matéria-prima ou ingrediente. 

Ademais, o projeto também tem como exigência a iniciativa dos fabricantes de produtos ou substâncias que não foram desenvolvidos a partir de testes com animais a aposição da expressão nos rótulos “(nome do produto ou ingrediente) obtido sem fazer uso de testes com animais vivos”. Nesse caso, a proposição determina que, aos infratores da lei, serão aplicadas as penalidades previstas no Código de Defesa do Consumidor e demais normas vigentes. 

Outrossim, a meta do Poder Público é regulamentar a lei e que as empresas tenham o prazo de 180 dias para se adequarem aos seus ditames. Em sua justificação, o autor defende o direito do consumidor de ser informado sobre a utilização de animais em testes para a obtenção de seus produtos ou substâncias.

O autor do PL, o ex-Deputado Ricardo Izar, atuou como deputado federal pelo estado de São Paulo, foi filiado ao Partido Progressista (PP) e exerceu mandatos consecutivos na Câmara dos Deputados do Brasil. Izar é conhecido por focar seu trabalho na proteção dos direitos animais, sendo autor de projetos de lei e iniciativas legislativas que objetivavam promover o bem-estar animal e combater os maus-tratos aos animais. Izar teve papel importante na aprovação da Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998) e também na criação da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável na Câmara dos Deputados. Além de suas atividades relacionadas aos animais, Ricardo Izar também teve envolvimento em outros assuntos políticos e comissões parlamentares ao longo de sua carreira, comandou a criação da Frente Parlamentar do Congresso Nacional em Defesa dos Direitos Animais, organismo ativo no parlamento brasileiro e do qual o parlamentar paulista segue presidente. 

O PL 2.470, criado em 2011, foi inicialmente apresentado ao Plenário, despachado às Comissões de Defesa do Consumidor (CDC) e de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), sujeita à Apreciação Conclusiva pelas Comissões e, em 2012, foi designado pela CDC o Deputado Eli Correa Filho (DEM-SP) para atuar como Relator. Em seguida, a Mesa Diretora realizou a apensação do PL 6.721/2013 — de autoria do Deputado Rodrigo Maia —, e PL 7.102/2014 — de autoria do Deputado Junji Abe. 

No contexto do Art. 4° da Política Nacional das Relações de Consumo, o Relator, Deputado Eli Correa Filho, aprovou o projeto em apreciação e ainda propôs anexo para aperfeiçoá-lo e tornar mais clara sua redação. Em seguida, o Projeto foi enviado à CCJC e a mesma designou o Deputado Raul Jungmann (PPS-PE) para atuar como Relator. Contudo, ainda em 2015, o Deputado Renato Molling (PP-RS) solicitou a redistribuição do PL n° 2.470 e de seus apensados, de modo que fossem também apreciados pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio (CDEIC), que o designou como Relator. 

O PL 2.470, assim como seus apensados, fora rejeitado pelo Deputado Renato Molling, Relator da CDEIC, por agregar mais informações ao rótulo de alimentos e, eventualmente contribuir para produção de “resultados contrários aos almejados pelas propostas sob análise”, afirmando que “o excesso de informação pode, muitas vezes, confundir mais do que orientar” (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2014). 

Devido a pareceres divergentes nas Comissões de Defesa do Consumidor, e de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio (atual CDE), o PL n° 2.470/2011 foi enviado à Mesa Diretora e transferida ao Plenário a competência para apreciar o Projeto. Ademais, no mesmo período, a Mesa Diretora apensou o PL 6.824/2017, de autoria do Deputado Victor Mendes, ao Projeto, devido ao caráter semelhante de ambos. 

Outrossim, em 2018, a CCJC designou o Deputado Covatti Filho (PP-RS) como Relator, em que o mesmo votou “no sentido de constitucionalidade, juridicidade e boa técnica legislativa dos Projetos de Lei n° 2.470, de 2011; n° 6.721, de 2013; n° 7.102, de 2014; n° 6.824, de 2017; e do substitutivo da Comissão de Defesa do Consumidor” afirmando que as proposições estavam bem redigidas e obedeciam às regras estabelecidas sobre as normas de elaboração, redação, alteração e consolidação das leis, conforme a Lei Complementar n° 95, de 1998. 

Todavia, o Deputado Covatti Filho (PP-RS) deixou de ser membro da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) e seu cargo como Relator do PL 2.470/2011 foi substituído pelo Deputado Dr. Frederico (PATRIOTA-MG) em 2019, que, por sua vez, adotou o parecer anterior do Dep. Covatti. Já o parecer da Comissão, ocorreu em conformidade com a decisão do Relator. 

Por fim, o Projeto de Lei n° 2.470, de 2011, foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania (CCJC) em outubro de 2019 e foi recomendado a aprovação por parte da Comissão de Defesa do Consumidor (CDC), em que a exigência, conforme exposto, valerá para as indústrias química, farmacêutica, cosmética, de alimentos, de produtos de limpeza e higiene, e os agropecuários, incluindo defensivos. O descumprimento sujeita a sanções administrativas, como multa, apreensão do produto, proibição da fabricação e até cassação de funcionamento.

Tendo em vista a motivação do projeto, no qual  busca oferecer  maior transparência para o consumidor na hora da compra de um produto, com a informação no rótulo de que o mesmo foi submetido a testes em animais vivos – ou não, e incentivar indústrias com teste zero em animais e busca a criação de uma cadeia de produção menos exploratória, mais sustentável e consciente, os grupos representantes envolvem empresas e fornecedores com produção livre de testes em animais, ONGs e OIGs engajadas na causa de bem-estar animal e de direito ao consumidor. Destina-se também ao consumidor que deseja estar ciente quanto ao uso ou não de animais descritos na formulação da embalagem na compra de um determinado produto. Já no teor governamental, são indivíduos/partidos políticos e comissões favoráveis em temas que visam à defesa dos direitos do consumidor e a proteção dos animais não humanos. 

Na tabela abaixo, apresentam-se os stakeholders do PL 2.470/2011, no qual identifica-se seu grau de apoio ou oposição ao tema. 

Fonte: Autoria própria, 2023

Os tomadores de decisão se destacaram com influência 5, visto que são os indivíduos/ instituições que possuem influência direta sobre a tramitação do PL 2.470/2011, como o Relator, Deputado Dr. Frederico (Patriota-MG), pelo parecer favorável e apoio ao projeto, o Deputado Renato Molling, pelo parecer contrário e oposição ao projeto, e a Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio que rejeitou o PL. 

Ainda, em audiência secundária, encontram-se os influenciadores do público e do Congresso, que varia desde influência 1 até 4. A ONG Change.org se destacou com poder 4 por criar, em 2016, um abaixo assinado a favor do PL e obter 310 apoiadores, o que gerou visibilidade e movimentação social ao projeto. Já a ONG World Animal Protection e canais midiáticos como a Vegazeta - Veganismo e  jornalismo, história e cultura e Consumidor RS tiveram por objetivo informar o leitor quanto ao projeto de lei e incentivar a movimentação social a favor do projeto, tendo como base os propósitos pessoais dessas instituições.    

Outrossim, a Action Relações governamentais demonstrou em seu relatório trimestral de 2020 posição contrária ao projeto, mas sem explicações fundadas quanto ao motivo da decisão. No âmbito de empresas e fabricantes, nenhuma publicou seu posicionamento, entretanto, é cabível projetar que empresas que já não praticam testes em animais se colocariam a favor do projeto, visto que teriam o direito de incluir em seus rótulos a expressão: “obtido sem fazer uso de testes com animais vivos”, sendo este um fator benéfico. Já o Fórum RedeIndústria da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e empresas que ainda realizam testes exploratórios em seres vivos, se demonstrariam contrárias, dado que buscam defender seus direitos como indústrias e a aprovação doo PL desencadearia efeitos não benéficos as mesmas, como perdas financeiras com suas vendas finais ou necessidade de alteração da logística de cadeia de produção. 

Por fim, a Ecofarma - consultoria Júnior UFJF se demonstra favorável, mas com pouco impacto direto, dado que é uma Empresa de Consultoria Farmacêutica Júnior que trouxe o PL 2470/2011 para exemplificar a pauta e oferecer um serviço livre de testes em animais, como opção de fornecedor substituto.  
  Em relação às audiências públicas, são definidas como uma forma de política pública que permite a participação da população, através da presença de autoridades e grupos interessados no assunto, acompanhados de especialistas e parlamentares que estão a favor e/ou contra o Projeto de Lei. Logo, é um exercício feito para a discussão de PLs que muitas vezes dividem opiniões nas comissões, ou que os parlamentares apenas buscam entender a visão pública sobre temas que desejam persuadir. É importante ressaltar que as APs são deliberações consultivas, que não possuem nenhuma obrigação legislativa, logo, tais são apenas convocadas para temas extremamente segregados entre os congressistas.
    Portanto, quando há um Projeto de Lei como o 2.470/11, em que o teor engloba comissões como a CDC (Comissão de Defesa do Consumidor), a MESA (Mesa Diretoria), o CCJC (Comissão da Constituição e Justiça e de Cidadania), e a CDE (Comissão de Desenvolvimento Econômico), há uma grande abertura para exigência de mudanças e discordâncias. Entretanto, o Projeto de Lei teve apenas uma emenda feita pela CDC antes do arquivamento do projeto em 2015 na Mesa Diretora e uma divergência de pareceres do CDE ao final do mesmo ano, quando o projeto já estava desarquivado e apensado com o PL 6.721/2013 e o PL 7.102/2014, logo, o tema nunca foi considerado questionável o suficiente, ou houve avanços apressurados para a constituição de audiências públicas.  

         Em suma, o Projeto ainda se encontra em processo de tramitação, sem agenda prevista para ser aprovado, ainda que hajam-se benefícios resultantes para a sociedade brasileira. Sendo assim, além da complexidade do processo, é perceptível que a delonga para a aprovação é consequência de outras demandas vistas como prioridades dentro da dinâmica política nos últimos 11 anos.

REFERÊNCIAS

AGENCIA DO SENADO. Audiência pública é último passo antes de a CCJ votar projeto sobre armas. 5 abr. 2023. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2023/04/05/audiencia-publica-e-ultimo-passo-antes-de-a-ccj-votar-projeto-sobre-armas. Acesso em: 1 jun. 2023.


ARIOCH, David.  Avança PL que cobra informações sobre testes em animais. Vegazeta, 23 de outubro de 2019. Disponível em: <https://vegazeta.com.br/avanca-pl-que-cobra-informacoes-sobre-testes-em-animais/>. Acesso em 2 jun. 2023.

CÂMARA DOS DEPUTADOS. Normas Regimentais sobre Audiências Públicas. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-permanentes/cft/normas-internas/Normas%20Regimentais. Acesso em: 30 maio. 2023

CAMOLEIS, Tatiane. Aprovar PL 2470/2011 - Produtos identificar nas embalagens se testados em animais vivos. Change.org, 24 de junho de 2016. Disponível em: <https://www.change.org/p/dep-renatomolling-camara-leg-br-aprovar-pl-2470-2011-produtos-identificar-nas-embalagens-se-testados-em-animais-vivos>. Acesso em 28 maio. 2023.

Dr. Frederico. UMA VITÓRIA PARA A CAUSA DE PROTEÇÃO AOS ANIMAIS: COM RELATORIA DO DEPUTADO DR. FREDERICO, PROJETO É APROVADO NA CCJC. Facebook, 23 Out. 2019.  Disponível em: <https://m.facebook.com/DrFredericoMG/posts/500576504117619/#_=_>. Acesso em 1 jun. 2023.

É possível evitar testes de cosméticos em animais?. Ecofarma Consultoria Júnior UFJF, 22 DE OUTUBRO DE 2021. Disponível em: 

https://ecofarmajr.com.br/blog/e-possivel-evitar-testes-de-cosmeticos-em-animais/. Acesso em 28 maio. 2023.

JUNIOR, Janary. Comissão obriga indústria a informar no rótulo sobre testes com animais vivos. Consumidor - RS, 18/05/2015. Disponível em: <http://consumidorrs.com.br/2013/inicial.php?case=2&idnot=38437>. Acesso em 3 jun. 2023. 

LARCHER, Marcelo; Cesar, Luciana. Comissão rejeita informação no rótulo sobre testes com animais vivos. Agência Câmara de Notícias, 28/10/2015. Disponível em:

<https://www.camara.leg.br/noticias/474237-comissao-rejeita-informacao-no-rotulo-sobre-testes-com-animais-vivos/>. Acesso em 3 jun. 2023. 

PEREIRA, Bruna. Audiências públicas: saiba como participar | Politize! 11 nov. 2016. Disponível em: https://www.politize.com.br/audiencias-publicas-como-participar/. Acesso em: 4 jun. 2023.

PORTAL da Câmara dos Deputados. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=522804. Acesso em: 4 jun. 2023.

PORTAL da Câmara dos Deputados. Disponível em: <https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1388192&amp;filename=Tramitacao-PL%202470/2011>. Acesso em: 2  jun. 2023.

PORTAL Deputado Federal Ricardo Izar. Biografia. Disponível em: <https://ricardoizar.com.br/comissoes/>. Acesso em 2 jun. 2023. 


PUCCIA Braz, Marcela. Eleições 2014: Conheça candidatos engajados na causa de bem-estar animal. World Animal Portection, 23/09/2014. Disponível em: <https://www.worldanimalprotection.org.br/not%C3%ADcia/eleicoes-2014-conheca-candidatos-engajados-na-causa-de-bem-estar-animal>. Acesso em 3 jun. 2023.

RELATÓRIO DE ATIVIDADE – 1 ̊ trimestre de 2020. Action Relações Governamentais, 2020. Disponível em: <https://abinpet.org.br/wp-content/uploads/2020/04/2020.04.03_Abril_1º-Trimestre_Relatório-13-2020.pdf>. Acesso em 28 maio. 2023.

SIGA LEI. CD PL 2470/2011, São Paulo, 2019. Disponível em: <https://web.sigalei.com.br/app/bill/QmlsbDpzbF9iaWxsLkNELlBMLjI0NzAuMjAxMQ%3D%3D/general>. Acesso em: 28 mai. 2023. 

Tags
ESPM
ENTRE EM CONTATO COM NOSSOS ESPECIALISTAS

Artigos Relacionados

Inscreva-se na nossa newsletter Alquimia Digital, e fique por dentro de como a inteligência artificial impacta seu dia-dia.
Thank you! Your submission has been received!
Oops! Something went wrong while submitting the form.