Leia entrevista de Paulo Almeida (Diretor Executivo do Instituto Questão de Ciência), segunda da série da Sigalei sobre os preparativos nesse período de mudanças nos poderes Legislativo e Executivo
Brasil se aproxima de uma nova configuração do ambiente político – em âmbito federal e estadual.
Para falar dessa nova etapa, a Sigalei procurou especialistas na área de Relações Institucionais e Governamentais.
Fizemos entrevistas sobre como eles reavaliam sua estratégia e o que levam em consideração.
Na segunda parte dessa série de entrevistas, a Sigalei ouviu o Diretor Executivo do Instituto Questão de Ciência (IQC), Paulo Almeida.
O IQC é o primeiro instituto no país voltado para a defesa do uso de evidência científica nas políticas públicas – concentrando sua atuação em três frentes: Educação Científica, Jornalismo Científico e Advocacy Científico.
Confira o resumo da entrevista:
1. Sigalei – Qual a importância, para o Instituto Questão de Ciência (IQC), de estruturar uma estratégia em Relações Institucionais e Governamentais (RIG)?
Paulo Almeida, Diretor Executivo do IQC: O nosso setor de Ciência e Tecnologia tem dificuldades de articulação. O IQC é uma organização nova, criada em 2019, e que não conta com histórico prévio de relacionamento, o que aumenta nosso desafio na mediação e articulação. Então, o que a gente está começando a fazer, enquanto organização, é suprir, em forma de serviço, uma deficiência setorial. Estamos construindo, do zero, o advocacy e ainda somos afetados por ainda não conseguir pautar o sistema de maneira muito eficiente.
2. Sigalei – Como o IQC vê esse período de transição no Legislativo e no governo? E quais os primeiros movimentos que devem ser tomados?
Paulo Almeida, Diretor Executivo do IQC: Toda mudança do Executivo e do Legislativo tem impacto muito grande para a formulação da nossa estratégia. Em um cenário de alternância de poder, a primeira coisa a ser feita é um mapeamento dos atores – tanto em nível estadual como federal. É preciso entender quais são as pautas prioritárias em cada uma das áreas (saúde, tecnologia, educação etc.) e identificar os pontos de conexão com as esferas de poder.
Logo na partida, um dos pontos sensíveis é a questão orçamentária. Temos a preocupação de mapear os atores que estão envolvidos com essa definição e analisar como a discussão vem sendo fomentada. Também é importante verificar como esse debate pode impactar a nossa área e, principalmente, entender quem está alocado em locais chaves para monitorar cada tema. No orçamento, Ciência e Tecnologia é uma área que costuma ficar como residual, entre outros grupos de pressão mais fortes, e, portanto, precisamos pensar e desenhar estratégias, com ações de pressão propositivas.
Em cenários de mudanças bruscas de governo, esse trabalho estratégico é ainda mais intenso, tanto para analisar políticas que poderão ser abandonadas como aquelas que devem ser retomadas. Então, em algumas macropolíticas antes esvaziadas como os programas Ciências Sem Fronteiras e Políticas de Cotas, por exemplo, é preciso monitorar a discussão. Entender se essas políticas serão retomadas e como, principalmente devido ao volume de recursos que possam demandar do orçamento público e do impacto que isso tem para o setor.
3. Sigalei – Neste período de transição, como estruturar ações práticas de atuação?
Paulo Almeida, Diretor Executivo do IQC: Seja entre governos eleitos ou reeleitos, é preciso um acompanhamento de grandes eixos de tomada de decisão. Buscamos agendar conversas com pessoas específicas dos setores que possam ter papel importante para a área de Ciência e Tecnologia nas gestões para nos ajudar a entender os rumos que as coisas vão tomar. Eventualmente, esses interlocutores podem ser bons pontos de contato, não só para levantar informações, mas para discutir planos de ações. Então, buscamos fazer reuniões para ver com quem a gente identifica e quem poderá ser um ator significativo.
Tudo isso se deriva em estratégias e ações. Há ações que precisam ser feitas independentemente de quem estiver no poder. No caso de outras ações, precisamos avaliar quais serviram apenas para um cenário específico, ou seja, foram desenhadas para um governo.
4. Sigalei – Você poderia citar algum exemplo de ações tomadas pelo IQC?
Paulo Almeida, Diretor Executivo do IQC: Um exemplo muito prático é o que fizemos desde o começo de 2020, quando a maior parte da nossa atuação foi pautada pelas decisões do governo federal, oficiais ou extra oficiais, principalmente nos temas relacionados à saúde. Estabelecemos uma política de emergência e ficamos muito concentrados em decisões abruptas, para que pudéssemos ter uma capacidade de manifestação quase que imediata para questionamento e enfrentamento.
Nesse acompanhamento, muito firme e determinado, em certa medida a gente avalia o que está calibrado em um ambiente onde há mais receptividade para questões propositivas e não tão reativas. Temos que avaliar nossa metodologia a partir do panorama do nosso setor, que é muito fraco na profissionalização do advocacy.
Ainda temos que evoluir nos processos de captar e assimilar informações relevantes que nos levem a de caminhos específicos de atuação. Também precisamos melhorar nossa capacidade de trânsito nas nossas áreas de interesse, tanto em Brasília como nas esferas estaduais, levando a informação. É assim que vamos sair do reativo para montar uma estrutura de acompanhamento mais clássica, racional e mais tradicional de atuação.
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*Por Sigalei