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LOBBY, CEPI E SIGALEI: parcerias para fomentar debates e construir cenários

A parceria entre Sigalei e CEPI-FGV já completou 1 ano! Confira o artigo escrito por Mariana Chaimovich e sua reflexão sobre como a conexão entre empresas e academia impulsionam o lobby e qualificam o debate em torno de políticas públicas.

Publicado em:
31/5/2022
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ste artigo encerra o primeiro ciclo de uma parceria de sucesso entre o Centro de Pesquisa em Ensino e Inovação (CEPI-FGV) e a Sigalei

Justamente por ser o último artigo desta primeira e muito bem-sucedida etapa da parceria, que completa um ano, nada mais justo do que tratar de algo que motiva a atuação institucional tanto do CEPI quanto da Sigalei: o aprimoramento de políticas públicas e a qualificação do debate no âmbito da sociedade civil. Particularmente, por intermédio da representação privada de interesses, relações governamentais ou, simplesmente, lobby.

Relembre nossa Parceria 

Mas, antes, vamos relembrar um pouco os temas que já foram discutidos no contexto desta parceria. A abordagem de temáticas relevantes no âmbito nacional pode ser verificada pela diversidade de temas e de esferas dos Poderes estudados e avaliados: temos desde mapeamentos a respeito de proposições sobre telemedicina, com destaques do debate legislativo federal; passando por projetos de lei sobre criptomoedas e criptoativos e as dificuldades do monitoramento legislativo e regulatório no Brasil. Pesquisou-se, também, a discussão sobre as diversas facetas da gig economy no Poder Legislativo da cidade de São Paulo; além de destaques em âmbito nacional de proposições sobre ensino superior. Foram feitas pesquisas sobre de que maneira compreender o combate ao discurso de ódio no Brasil; sobre mapeamento e acompanhamento do contexto de reforma da Lei de Direitos Autorais e sobre a temática de saúde e inovação, ou “e-health”. Finalmente, foram abordados projetos que pretendem alterar a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais e que tratam de Algoritmos e Inteligência Artificial na Câmara e no Senado. Ufa!

Acesse todos os artigos publicados por esta parceria no link abaixo:

Artigos Parceria CEPI + Sigalei 

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Lobby regulamentado para qualificação do debate público 

A ideia de elaborar um artigo sobre lobby representa a intenção de comunicar todas essas contribuições da maneira mais transparente possível. Em um país no qual o lobby é regulamentado, o objetivo final da regulamentação é, justamente, tornar essa comunicação aberta aos interessados, para que haja paridade e simetria de informações, para que se saiba quem disse o que para quem e quando. Discute-se, porém, se iniciativas nesse sentido realmente fomentam o aumento da transparência, ou apenas impõem mais empecilhos e burocracia para a comunicação entre atores públicos e privados. Veremos, adiante, quais proposições tramitam, hoje (maio/2022), no Poder Legislativo Federal e tratam do tema.

A pesquisa foi feita no início de maio/2022, com o termo “lobby” em projetos de lei em tramitação na Câmara dos Deputados (CD) e no Senado Federal (SF). Trouxe 26 (vinte e seis) resultados, dos quais 21 (vinte e um) foram descartados por apenas trazerem o termo “lobby” incidentalmente, ou seja, não terem como objetivo a regulamentação da atividade, apenas a mencionarem na justificativa, ao tratar do tema específico em pauta. 

Restaram, portanto, 5 (cinco) proposições, cujas ementas seguem abaixo e são dispostas em ordem de apresentação:

  1. CD PL 4391/2021: Dispõe sobre a representação privada de interesses realizada por pessoas naturais ou jurídicas junto a agentes públicos;
  2. CD PL 1961/2015: Disciplina a atividade e atuação de pessoas e grupos de pressão ou interesse no âmbito dos Poderes Legislativo e Executivo, e dá outras providências;
  3. CD PL 1202/2007: Disciplina a atividade de "lobby" e a atuação dos grupos de pressão ou de interesse e assemelhados no âmbito dos órgãos e entidades da Administração Pública Federal, e dá outras providências;
  4. CD PL 6928/2002: Cria o Estatuto para o exercício da Democracia Participativa, regulamentando a execução do disposto nos incisos I, II e III do art. 14 da Constituição Federal;
  5. CD PL 6132/1990: Dispõe sobre o registro de pessoas físicas ou jurídicas junto às casas do Congresso Nacional, para os fins que especifica, e dá outras providências.

PL 4391/2021 avança na Câmara dos Deputados

Todas as proposições apresentadas acima tratavam do tema, em diferentes medidas e com abordagens próprias. Será analisado, nesta oportunidade, exclusivamente o PL 4391/2021, por ser a única proposição com pontuação no radar Sigalei de temperatura (com 8.8 pontos, enquanto todos os outros possuíam zero). Isso significa que essa proposição, até o momento, tramitou mais rápido do que 88% de todas as proposições do mesmo tipo da mesma Casa legislativa, consideradas as proposições em tramitação durante os últimos 90 dias. O radar de temperatura é uma ferramenta que permite ao usuário aferir as movimentações mais recentes de determinado projeto, o que possibilita focar as atenções – e os eventuais esforços na interlocução com parlamentares – em PLs com movimentações mais recentes. Trata-se de mais uma importante contribuição da Sigalei para a atividade de nós, lobistas.

O projeto, de autoria do Poder Executivo, tem como objetivo, de acordo com sua Justificativa, dispor sobre:

  1. a representação privada de interesses realizada por pessoas físicas ou pessoas jurídicas junto a agentes públicos dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, tendo como objetivo o respeito aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade;
  2. o estabelecimento das regras de transparência e de integridade no exercício da representação privada de interesses junto a agentes públicos;
  3. a definição de conceitos primordiais que envolvem o tema, como  "representação privada de interesses", "representante de interesses", "presente", "brinde", "hospitalidade", entre outros considerados pertinentes;
  4. a previsão de vedações e sanções a agentes públicos e privados; e
  5. a previsão de responsabilização administrativa dos representantes de interesses

A própria justificativa do PL menciona o fato de que a minuta de projeto é resultado de esforço da Controladoria-Geral da União (CGU), que partiu da avaliação do Substitutivo apresentado em 2018 pela Deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ) ao PL 1202/2007, acima mencionado. Ainda de acordo com a Justificativa, os integrantes da CGU estudaram as melhores práticas na regulamentação da representação privada de interesses (ou lobby) ao redor do mundo, e a proposição em análise seria resultado direto desse esforço. O objetivo seria tornar mais clara a representação privada de interesses, permitindo maior efetividade na repressão às condutas reprováveis[1].

O PL 4391/2021 está estruturado da seguinte maneira:

  • Capítulo I | DISPOSIÇÕES PRELIMINARES: determina a quem se aplicariam as disposições sobre representação privada de interesses realizada por pessoa física ou jurídica junto a agentes públicos. Fato interessante é que a proposição apresenta definições dos termos que utiliza, o que certamente pode ser considerado uma boa prática no que se refere a redação legislativa, por esclarecer de maneira detalhada do que se está falando ao mencionar, por exemplo, a expressão “representação privada de interesses” ou “representante de interesses”. Além disso, define o que não é considerado representação privada de interesses;
  • Capítulo II | DA REPRESENTAÇÃO PRIVADA DE INTERESSES JUNTO A AGENTES PÚBLICOS: define os princípios da atividade, bem como o fato de as audiências entre atores públicos e privados poderem ser presenciais ou remotas, por exemplo;
  • Capítulo III | DA TRANSPARÊNCIA E DA INTEGRIDADE NA REPRESENTAÇÃO PRIVADA DE INTERESSES: determina quais autoridades obrigatoriamente publicarão as informações a respeito das audiências com representantes particulares de interesses. 
  • Capítulo IV | DO REGIME DE RESPONSABILIZAÇÃO: este capítulo está dividido em seções, quais sejam: das infrações praticadas (i) por agentes públicos e (ii) por representantes de interesse. Ambas preveem sanções.
  • Capítulo V | DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DE RESPONSABILIZAÇÃO DO REPRESENTANTE DE INTERESSES: de acordo com este capítulo, a instauração bem como o julgamento de processo administrativo para apurar a responsabilidade do representante de interesses cabem à autoridade máxima de cada órgão ou entidade dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Essas autoridades agiriam de ofício ou mediante provocação.
  • Capítulo VI | DISPOSIÇÕES FINAIS: traz maiores detalhes sobre as sanções previstas.

A proposta considera representação privada de interesses a interação entre agente privado e agente público com o objetivo de influenciar o processo decisório ou a tomada de decisões no âmbito da administração pública, como na formulação de uma política pública, ou na elaboração de ato normativo, como portaria ou decreto. Esse representante de interesses, ou lobista, pode ser qualquer cidadão (pessoa física) ou empresa (pessoa jurídica) dedicada a essa atividade, seja em nome próprio ou de terceiros, mediante remuneração ou não.

A transparência dessas interlocuções adviria, entre outros motivos, das disposições da proposição a respeito dos encontros, ou audiências, com os chamados lobistas. Estas devem ser divulgadas, bem como publicadas informações sobre audiências com Ministros de Estado, servidores do alto escalão e congressistas. Importante ressaltar que, de acordo com a proposta, caberia aos Estados, DF e municípios definir regras específicas sobre a divulgação de informações das reuniões, desde que respeitadas as regras gerais estabelecidas na (eventual) Lei federal. A agenda publicada deverá identificar não apenas o lobista e os seus clientes, mas também o interesse em pauta, que será discutido na ocasião.

Importante salientar que a possibilidade de regulamentação por parte de Estados, DF e municípios pode dar margem a uma miríade de regulamentações que possivelmente prejudicariam exatamente aquilo que o Projeto pretende regulamentar. É um ponto de atenção a ter em relação à proposta atual. 

Este era, em síntese, o objetivo deste artigo: apresentar o panorama do projeto de lei mais recente a respeito da representação privada de interesses, ou “lobby”. Não sabemos se a proposta será aprovada exatamente da maneira como foi proposta, ou se será objeto de emendas ou até mesmo substitutivo, mas sabemos que a intenção de regulamentar a prática já é discutida em ambas as Casas do Congresso Nacional desde a década de 1990. Esperamos que, ao regulamentar essa interação entre o Poder Público e os atores privados, a proposta alcance o que se propõe a fazer: dar mais transparência à troca de informações, diminuir as assimetrias informacionais e tornar a disseminação de dados mais acessível. Ao acompanharmos essa discussão, integro o rol de profissionais que almeja que nossa atuação seja considerada fortalecedora da democracia, justamente por representar e apresentar perspectivas distintas, por construir pontes e por promover o diálogo[2].

Não poderia encerrar esta contribuição sem os devidos agradecimentos aos times CEPI e Sigalei. Meus agradecimentos especiais para toda a equipe da Sigalei, nas pessoas de Ivan Ervolino e de Nayara Cortez, extremamente atenciosos durante todo este processo, sempre lendo os textos com cuidado, discutindo sugestões e auxiliando as pesquisadoras e os pesquisadores a sanar todas as dúvidas em relação à plataforma. Meus agradecimentos para toda a equipe do CEPI, e nominalmente para as autoras e os autores dos artigos, em ordem alfabética: Alice C. Gonçalves; Ana Carolina R. Dias Silveira; Ana Paula Camelo; Bruno Ett Bícego; Enya Carolina Silva da Costa; Fabrício Vasconcelos Gomes; Guilherme Forma Klafke; João Pedro Favaretto Salvador; Laurianne-Marie Schippers; Maria Eduarda Freire; Tatiane Guimarães e Victor Doering Xavier da Silveira.

O próximo ciclo vai apresentar relatórios que utilizam a plataforma no contexto de projetos mais amplos do CEPI. Teremos contribuições robustas com periodicidade trimestral, com a participação de equipes que lidam com diferentes projetos do Centro. E que venham as próximas contribuições para o debate!

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Este artigo foi escrito por Mariana Chaimovich — advogada, doutora pelo Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo e mestre em Direito Internacional pela USP. Atua como consultora de relações governamentais.

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Referências no texto:

[1] Informação disponível em: https://www.camara.leg.br/noticias/863642-projeto-do-governo-regulamenta-atividade-de-lobby-no-brasil/

[2] Esta percepção é exclusiva desta que vos escreve, e não pode ser considerada uma manifestação institucional nem do CEPI, nem da Sigalei.

Tags
CEPI-FGV
Lobby
Relações Governamentais
Relações Institucionais e Governamentais
Relações Institucionais
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