evido ao momento atual, com a pandemia do novo coronavírus, debates importantes acerca do mercado de vacinas têm ocorrido. Desenvolver uma vacina não é tarefa fácil por muitas razões, como o fato de que ao mesmo tempo em que se espera que ela consiga estimular o sistema imunológico a criar anticorpos, existe a necessidade também de que ela não gere a doença que visa combater no organismo das pessoas. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a vacinação ajuda na prevenção de 2 a 3 milhões de mortes anuais ao redor do mundo e caso fosse mais acessível, poderia, ainda, prevenir mais 1.5 milhões de mortes por ano.
Diante disso, percebe-se a importância do mercado global de vacinas. Este tem se consolidado através de décadas e demonstra um crescimento estável, bem como barreiras significativas para a entrada de outros players no setor. Ademais, é um mercado de alta rentabilidade, especialmente se comparado a indústria farmacêutica, que é mais vasta. Essas características se manifestam por diversas razões, tais como o fato desse mercado possuir 4 players que representam 90% da indústria (GSK, Merck, Pfizer, Sanofi); apresentar uma tendência estável de preços, mesmo após vencimento de patente, além de ser dificilmente afetado por reformas nos preços dos medicamentos - pode contudo, ser impactado por movimentos anti-vacinação.
É fato que, recentemente, esse mercado vem recebendo mais atenção e necessidade de investimento, especialmente em virtude da busca pelo desenvolvimento de uma vacina para o Covid-19. Tal corrida está inclusive destacando empresas de biotecnologia que antes não possuíam muita visibilidade. Apesar dessa vacina em específico ter o potencial de gerar uma receita de bilhões de dólares nos próximos anos, o que se precisa analisar também, é como ficará o mercado da tecnologia que envolve o desenvolvimento de uma vacina. Isso porque ela acelerará o processo de inovações tecnológicas e poderá colaborar na expansão do círculo fechado dos principais players da indústria de vacinas, sendo a tendência a de geração de maior competição e pressão dentro desse mercado.
A respeito do crescimento quantitativo do mercado, tem-se, de acordo com a S&P Global Ratings, que esse mercado tem experienciado ao longo das últimas duas décadas um crescimento anual de mais de 6% nos últimos 5 anos e é esperado um crescimento anual entre 5 e 7% nos próximos 5 anos, sem contar o crescimento gerado com a vacina do COVID-19. Para se chegar a esses números, são pensados o desenvolvimento de novas vacinas, preços altos em vacinas inovadoras e aumento das demandas em mercados emergentes, por exemplo.
Os processos regulatórios para gestão do sistema de saúde são utilizados para reduzir a desigualdade entre entes públicos e privados, bem como colaborar no equilíbrio e coerência entre oferta e demanda dos serviços. O artigo 196 da Constituição Federal de 1988 garante aos cidadãos o direito de acesso universal à saúde, tornando necessária a regulamentação da área da saúde, para que as pessoas compreendam de maneira integral o que é entendido por acesso à saúde e quais são as responsabilidades dos governos federal, estadual e municipal em efetivamente garantir um acesso de fato universal. É importante compreender que independentemente de quem é a principal autoridade para regular, a ação regulatória contribui para a otimização de recursos disponíveis e também para fazer valer o que a Constituição prevê em termos de direito ao acesso universal.
O ambiente regulatório internacional segue uma espécie de lei comum para a produção de vacinas. A triagem de uma potencial vacina se dá de forma similar em grande parte dos países. Segundo a FDA, U.S. Food and Drug Administration, corpo responsável pela regulamentação de alimentos e medicamentos no território dos Estados Unidos - similar à ANVISA do Brasil - a regulamentação segue um processo minucioso. Os cientistas e médicos da FDA levantam informações e acompanham a evolução da vacina até que esta se prove segura e efetiva. As vacinas produzidas pelo laboratório AstraZeneca em parceria com a Universidade de Oxford, até então a mais promissora, passa por fases de testagem, estando na terceira e última fase. Nesta etapa, afere-se a eficácia e segurança da vacina em seu público-alvo. Mostrando-se eficaz e segura, a vacina parte para a fase de produção, ainda inspecionada pelo órgão que a regulamentou para se confirmar a excelência na produção.
O cenário de regulamentações brasileiro é controlado pela ANVISA, Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Para que algum medicamento chegue ao Brasil, este deve passar por diversas etapas de cadastro. A ANVISA possui um regimento que analisa e classifica qualquer elemento conforme suas especificidades como medicamento e também seu risco. Feita essa análise, o corpo regulador determina a possibilidade de registro ou não deste medicamento.
Se registrado, a agência reguladora ainda possui um mecanismo de farmacovigilância, que é o acompanhamento de eventos adversos relacionados ao uso de fármacos. Se aprovado o uso de alguma vacina em território brasileiro, ainda existe uma série de exigências para que se receba um alvará de vacinação, seja uma instituição pública, privada, civil ou militar, como previsto na Resolução da Diretoria Colegiada nº 197, de 26 de dezembro de 2017.
Esta resolução prevê que o alvará de funcionamento só será concedido com a presença de um alvará de licenciamento emitido pelo órgão sanitário competente dos Estados, Distrito Federal ou dos Municípios, contendo permissão para a prestação do serviço sob regime de vigilância sanitária.
Além dessa exigência, também se faz necessária a disposição de um espaço adequado, profissionais licenciados, estratégias de vacinação e outras questões técnicas. A necessidade de um licenciamento por parte dos estados e municípios, anterior à campanha de vacinação, pode ser um empecilho em um momento delicado como o atual. A extensão do território brasileiro, a enorme quantidade de municípios e até a dificuldade de alcançar certos locais do país já é, por si só, um dos maiores obstáculos no fornecimento de vacinas.
Frente à assustadora marca de 100 mil mortes e com a abertura de Universidades públicas para testes, é possível que diante de uma vacina eficaz os tomadores de decisão se mostrem dispostos a formar parcerias rapidamente. O Congresso e os governadores foram um pilar importante para o gerenciamento da crise e, portanto, devem continuar agindo na regulamentação da vacina. O Ministério da Saúde está em processo de negociação com organizações internacionais e pensando em parcerias, o que pode ser reflexo da pressão por várias partes do governo e da sociedade civil.
O ambiente regulatório e a percepção sobre o ambiente científico em geral foram transformados e, principalmente, afetados por um sentimento de emergência e vigilância que pode tornar o ambiente mais flexível, mas nada garante que será assim para as próximas discussões.
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